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sábado, 18 de dezembro de 2010

Ligéia - Edgar Allan Poe - Parte 5

Bem no meio da noite durante a qual partiu, chamando autoritariamente, a seu lado, ela me pediu para repetir-lhe certos versos, que ela mesma compusera, não muitos dias antes; obedeci-lhe. Eram os que seguem:

Vede! é noite de gala, hoje, nestes

anos últimos e desolados

Turbas de anjos alados, em vestes
de gaze, olhos em pranto banhados,
vêm sentar-se no teatro, onde há um drama
singular, de esperança e agonia;
e, ritmada, uma orquestra derrama
das esferas a doce harmonia.
Bem à imagem do Altíssimo feitos,
os atores, em voz baixa e amena,
murmurando, esvoaçam na cena,
São de títeres, só, seus trejeitos,
sob o império de seres informes,
dos quais cada um a cena retraça
a seu gosto, com as asas enormes
esparzindo invisível Desgraça!

Certo, o drama confuso já não
poderá ser um dia olvidado,
com o espectro a fugir, sempre em vão
pela turba furiosa acossado,
numa ronda sem fim, que regressa,
incessante, ao lugar de partida;
e há Loucura, e há Pecado, e é tecida
de Terror toda a intriga da peça!
Mas, olhai! No tropel dos atores
uma forma se arrasta e insinua!
Vem, sangrenta, a enroscar-se, da nua
e erma cena, junto aos bastidores,
a enroscar-se! Um a um, cai, exangue,
cada ator, que esse monstro devora.
E soluçam os anjos - que é sangue,
sangue humano, o que as fauces lhe cora.
E se apagam as luzes! Violenta,
a cortina, funérea mortalha,
sobre os trêmulos corpos se espalha,
ao cair, com um rugir de tormenta.

Mas os anjos, que espantos consomem,
já sem véus, a chorar, vêm depor
que esse drama, tão tétrico, é "0 Homem"
e que o herói da tragédia de horror
é o Verme Vencedor.

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